A segunda temporada de Supernatural foi ao ar em 2006, manteve a narrativa de início sobre a busca pelo pai e a luta contra as forças sobrenaturais do mal, mas fez mudanças radicais, como o destino de John Winchester (Jeffrey Dean Morgan), as mudanças de Dean e Sam, e deu continuidade aos planos do grande vilão do seriado até aqui; se a primeira temporada deu apenas uma noção de que algo grande estava para acontecer, esta concretizou (não vou dar spoiler, caso alguém esteja assistindo – antes tarde do que nunca 🙂 – é claro).

Esta temporada acresceu tons de humor e uma mudança radical de roteiro (para melhor, muito melhor) com muita ação. O humor destoou um pouco, pois nem sempre combina com suspense e terror, mas a ação acertou em cheio, as lutas ficaram melhores, os tiroteios mais intensos, e as ações policiais de tirar o fôlego. Eric Kripke conseguiu um milagre, combinar FBI e sobrenatural, de forma a não cair no ridículo e ainda fazer muitíssimo bem feito, é uma temporada de muita ação e aventura, e de loucuras também.

O episódio 9 – Croatan é o mais assustador, e é onde a ação ganha espaço com seriedade de uma vez, a produção é inegavelmente melhor, a fotografia e cinematografia ganham mais vida, os sustos que já eram bons ganham mais realidade ainda (alguns vão te fazer pular da cadeira), e as trilhas sonoras que na primeira temporada serviram em boa parte do tempo para situar o expectador na época, agora são muito mais voltadas ao estado de espírito da dupla e às situações em si, é também uma evolução notável, e a edição permanece com a mesma qualidade, sempre com cortes suaves que ajudam a acompanhar o ritmo do roteiro. Kripke novamente dirigiu como um mestre, não há uma única queixa técnica.

O que saltou aos olhos enquanto capacidade técnica foi o desenvolvimento da atuação de Dean (Jared Padalecki), que logo no segundo episódio já se tornou visível, num salto enorme de qualidade, enquanto Sam (Jensen Ackles) só alcança a mesma qualidade no final da temporada, mas sim alcança, ambos melhoraram muito mesmo, vestiram muito mais os personagens e entregaram-se à estória com muito mais alma.

No final da temporada tive a nítida sensação que Dean Winchester fora inspirado em James Dean, posso estar errado, mas seria muita coincidência.

Ainda sobre a atuação de ambos, a situação é um pouco complexa, pois a curva dramática de Dean é uma acedente constante, enquanto a de Sam é mais lenta, se no final Dean é de um espírito paternal e maduro, Sam está apenas aos poucos tornando-se um homem.

Muitas questões de cunho filosófico novas são inseridas. Na primeira temporada, Kripke questionou (e resolveu!) a relação entre destino e livre-arbítrio, na segunda os problemas são dilemas que acertam arestas da personalidade da dupla. Os irmãos Winchester são uma dialética entre opostos, uma tensão permanente entre o impulso de Dean e a hesitação de Sam, e nesta temporada eles precisam lidar com isso novamente, só que de forma mais madura, em questões como a capacidade das aparências para enganar, o discernimento entre indivíduo e coletivo (em especial nos episódios com vampiros), e outras questões menores. Como cenário psicológico, o processo de luto é excepcionalmente explorado, com paciência e precisão pelo roteiro, e é justamente o motivo central da curva dramática da dupla, esta temporada na verdade gira em torno disso, do começo ao fim, e conclui com sucesso o processo. É uma temporada sobre emancipação, sobre responsabilidade individual.

As lendas continuam sobre personagens folclóricos e mitos religiosos de culturas diversas, há um vilão inclusive do Alcorão, num dos últimos episódios. A simbologia impressa é renovada no mesmo tom, dessa vez com um personagem histórico, Samuel Colt, o inventor armeiro americano de 1814, cuja arma inventada, um revólver colt especial com poderes sobrenaturais que pode matar demônios, aqui a simbologia é maravilhosa, pois significa que as armas foram criadas com a clara missão de combater o mal, não de atacar, mas de defender; que as armas foram feitas para o bem, esse signo semiótico poético está ali, e merece muito respeito.

Kripke também fez algo sensacional, resolveu problemas da primeira e segunda temporadas que supunha eu ser a meta narrativa (e eram), mas criou novos de igual tamanho, a estória promete mudar na próxima temporada, esta temporada termina aquele sabor de “o problema foi resolvido, mas…”.

O desenvolvimento desta temporada e sua conclusão, deixam a impressão de missão cumprida e simultaneamente de continuidade, como se o grande problema da primeira temporada fosse apenas o primeiro passo em direção a um mistério que ainda se apresentará, Kripke trabalha de plano de fundo com uma questão do sentido da vida, o momento em que nos tornamos adultos, e que nos vemos sozinhos diante de um imenso mar de desafios, mas que estamos prontos e que precisamos lutar, é como eu disse antes, emancipação.

A temporada é ótima, eu gostei muito e agora, vou começar a terceira. 🙂